sábado, 24 de julho de 2010

VIII

A luz que entra pela janela do quarto de Maria, trazendo consigo o
calor do sol faz com que Maria desperte de seu sono. Em seu quarto
tudo é milimetricamente organizado. Maria levanta, toma banho e como
se fizesse isso todas as manhãs de sua vida, Maria põe a roupa, coloca
o sapato azul, pega o dinheiro em cima da cômoda. Maria sai do quarto,
desce as escadas segurando o corrimão, vai para a cozinha, assobia,
seu cachorro “Pega Leve” logo vem ao encontro da dona, Maria coloca
seus óculos escuros e sai com “Pega Leve” pela porta da cozinha.

Em cima da mesa uma bolsa de mercado vazia e outra ainda com os
produtos. Maria está na pia segurando com a mão esquerda um pedaço de
alcatra que está sobre a pia e com a mão direita segura a faca para
cortar a carne, Maria levanta a mão sabendo que ali em baixo da lamina
contém 1kilo de carne, gordura, sangue e sua mão. No exato momento em
que ela desce aquela lâmina, com força, como se fosse uma guilhotina,
toda a luz do universo se apaga, o calor da luz do sol ainda existe,
mas a luz se esgotou, foi cortada ou apenas deixou de existir e Maria
continua a cortar a carne sem problemas. No minuto seguinte, escuta-se
“Estou Cego”, “Não consigo enxergar.”, “Meus olhos”... Por toda a
cidade, logo essas vozes se misturam ao som de batidas de carro e
explosões e isso continuou por todo o dia.

Maria está em sua cama, agradecendo a Deus pelos acontecimentos de seu
dia, como se
tivesse desejado muito que aquilo viesse a acontecer. Com um sorriso
puro modelando a sua boca e sua face como se aquele fosse o melhor dia
de sua vida, Maria dorme tranquilamente mesmo em meio a todos aqueles
choros e gritos de pessoas que afirmam estar cegas.

Maria ficou cega há 23 anos após ter sido violentada e torturada por
dois homens.

por Getúlio Ribeiro

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