quarta-feira, 25 de agosto de 2010

LXXI


Abriu os olhos após horas de sono. 
Ainda pensando no sonho que acabara de ter, esperava ver a claridade em sua janela de vidro granular entrando em seu quarto como todos os dias. Porém nada podia ver. Nem ela mesma. 
Não sabia muito bem o que estava acontecendo consigo. Ouvia vozes falando e sussurrando de algum lugar. – Estamos ficando malucos? Levantou-se desorientada, e com as mãos tremendo tateando seus objetos, abriu a janela, mas nada podia ver. Nem a cor do sol amarelo, nem o verde das árvores, nem o azul do céu, muito menos o vermelho. Apenas a cor preta predominava ao seu redor, de dentro para fora. - Estou eu também fora de minhas faculdades mentais? , se perguntou. O que seria dela sem as cores, se não o preto? Há algum tempo, preferia que isso tudo acontecesse, mas superou. O preto representava o nada, o mistério, com seus olhos fechados, acompanhados de intensificação de outros sentidos. A audição de vozes de esperança, o tato de objetos e corpos, o cheio de sândalo e putrefações; o gosto nenhum. O preto puro, sem nada, o nada, o invisível, a sua cegueira de ver o mundo, pois não tinha outros olhos. Sentiu-se triste. O preto nada mais é que a falta de ver coisas belas e sonhos vitorianos. Nada mais importava naquele momento. As luzes a conduziam e faziam seu corpo expandir de alegria. Penetrou-se em si mesma, pois já não queria mais olhar o nada. Deitou-se com dificuldade, suas lágrimas escorriam quentes em seu rosto, e ao sentir o gosto salgado a fez aliviar-se de suas frustrações do mundo. Fechou os olhos, mas nada havia mudado. Até adormecer e lembrar-se de como as luzes eram tão mais belas de quando ela havia achado que tinha reparado em todos os seus gestos. Então sonhou mais uma vez. 

por mayara freire

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